quarta-feira, 17 de abril de 2019

Gestar

Seis meses se passaram
A espera continua
Os sentimentos mudaram
Minha vida se torna cada vez mais tua.

Gerar-te me transforma
Perceber a tua vida me engrandece
Dar-te a vida, me enobrece.

Ainda restam alguns passos
Sons, batidas, mexidas, dores
E enfim o choro
Choro e alegria que estarão juntos
E eternizados em amor, vida e passos.

domingo, 9 de julho de 2017

Quem é Maria


Quem é Maria?


Um hino católico diz que "uma entre todas foi a escolhida; foste tu Maria, serva preferida".

Enquanto Milton Nascimento canta "Maria, Maria é um dom, uma certa magia; uma força que nos alerta; uma mulher que merece viver e amar como outra qualquer do planeta".

Por outro lado, Marisa Monte canta "Maria de verdade".

Mas, afinal, quem seria Maria?

Maria sou eu, você, minha mãe, a sua e pode ser até o seu e o meu pai.
Maria é dona de casa, é empresária, é pacífica, é guerreira.
Maria é mãe, é meretriz, é donzela, é solteira.
Maria é enfermeira, é cantora, é professora, é aeromoça.

Atriz, dançarina, bailarina e embaixatriz.
Aeronauta, jogadora, tatuadora, internauta.
Administradora, contadora, advogada.

Rainha, amiga, irmã, prima, tia, esposa.
Repórter, escritora, redatora, blogueira
Roteirista, artista e estilista.

Índia, branca, negra.
Indiana, europeia, brasileira.
Inglesa, portuguesa, chinesa.

Antipática, chata, calada
Antissocial, popular, tímida.
Arrogante, humilde, sofrida.

Alguém pode dizer quem é Maria?
Maria é mulher que sofre, que chora e rir.
Ama intensamente.
Rala bravamente.

Quem é sua Maria?
Você é uma Maria?
Qual Maria é você?
Quantas Marias você é?
Quais Marias você conhece?
Com quantas Marias você vive?


Quem é, de verdade, Maria?

Por Ivanete Damasceno

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

EM QUE POSSO AJUDÁ-LO, FREGUÊS?




Por Josi Gonçalves*

A menina magrela se escondia atrás de um ramo de coentro e cebolinha no mercado velho. Devia ter uns seis, sete anos. De forma quase inaudível ela oferecia o produto aos fregueses: - Olha o coentro, olha a cebolinha...

- A bichinha, diziam alguns antes de comprar as ervas, também conhecidas como cheiro verde e muito utilizadas na culinária nordestina. Acho que compravam por dó.

Quando o estoque que cabia em seus bracinhos magros se acabava, ela ia ao encontro da mãe para pegar mais daquelas ervas. A mulher não sabia, mas para a filhinha era um imenso suplício vender. Não por orgulho. Mas por timidez e medo.

Alheia ao sentimento de vergonha que borbulhava no peito e no estômago da menina, a mãe a municiava com mais uns “maços” de verdura e a mandava retornar ao mercado. Obediente, ela ia e, mais uma vez, se protegia do mundo atrás daqueles ramos de coentro.

Após vender tudo, montava sua banquinha feita de duas caixas empilhadas, dessas de tomate, para ajudar a mãe a debulhar feijão verde numa grande bacia de alumínio. Já não tinha mais medo, nem vergonha. Estava segura ao lado daquela mulher a quem tanto admirava. Nenhum mal podia lhe acontecer.

Minutos depois era recompensada. Com o dinheiro arrecadado com as vendas no mercado a mulher lhe comprava um copo de leite e um cuscuz com coco. Também, pudera! Já passara das oito horas da manhã e as duas haviam saído de casa às quatro da matina sem comer nada porque não tinha em casa.
Às vezes o dinheiro era suficiente para comprar comida apenas pra garotinha.

A menina tinha quatro irmãos mais velhos e era dela a responsabilidade de voltar pra casa com a comida do almoço e jantar. Entre nove e dez horas da manhã uma ambulância da cidade passava pela feira e levava a menina pra casa. Gentileza de uma freira que gerenciava o hospital.

Com a barriguinha cheia, ela ia contente porque ia saciar a fome dos irmãos também. Numa sacola ela transportava feijão verde, carne moída e ossos pra sopa. Esse era o cardápio do almoço e janta. Todos os dias. Durante meses a fio. A resiliência os ensinou a nunca reclamar nem se queixar de nada. O pouco com Deus era muito, dizia o pai.

O tempo passou célere pela banca da feira e corredores sujos do mercado. Levou junto o sofrimento daquela família e trouxe bonança e fartura pra mesa da garotinha que cresceu, virou gente grande. 

Mas, vez por outra, diante de um novo desafio, ainda se sente aquela menina magrinha que tentava se esconder do mundo atrás de um ramo de coentro e cebolinha.

Aí respira fundo, lembra que hoje é ela que “debulha” os problemas e dirige a “ambulância” que socorre a muitos. Então, senta sobre a pilha imaginária de caixas de tomate e pergunta pra quem está do outro lado da bacia: - Em que posso ajudá-lo, freguês?

Josi Gonçalves é jornalista, flerta com o politicamente incorreto, anda de mãos dadas com a irreverência, pinta a cara com as cores da rebeldia e todos os dias faz planos de dominar o universo. 

quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

COMO DESCOBRI QUE MEU FILHO É AUTISTA



Por Josi Gonçalves*

Davi nasceu prematuro. Ficou nove dias na UTI. Com 17 dias eu já o levei pra passear no shopping. Não queria criar uma redoma em volta dele e nem um conceito de pobrezinho, coitadinho, frágil demais. Os meses passaram voando. Quando dei por mim, meu bebê, que tinha saído do hospital com 2,4 kg, já estava pesando oito quilos aos seis meses.

Crescia forte, saudável, rosado. O que me incomodava era a demora pra andar, falar. Me queixei ao pediatra que o atendia desde o primeiro mês. Cada criança tem seu ritmo, mãe, dizia ele. E não é que ele tinha razão? Meu pequeno andou com um ano e três meses. Poucos meses antes começou a balbuciar mamã e papá.

Quando vi, ele já tinha dois anos. Ainda esperava ele falar mais articulado, mas ficava feliz em ver que o danadinho tinha verdadeira adoração pelo alfabeto, em inglês e português, e o conhecia de cabo a rabo. Achei tão bonitinho que, apesar dele ter babá, resolvi matriculá-lo numa escola que ficava a uma quadra da minha casa.

A escola tinha câmeras de segurança que permitia aos pais acessar as imagens das salas de aula pelo celular. E eu acessava vez por outra pra matar a saudade, mas uma coisa me intrigava. Ele estava sempre isolado. Não se misturava às outras crianças. Procurei as professoras. Me disseram que era excesso de timidez e que com o tempo ele iria se adaptar.

Em casa era sociável. Mas não chegava a ser receptivo às visitas. Fazia o tipo marrentinho. Inclusive na própria festa de aniversário de dois anos, onde chorou o tempo inteiro na hora de cantar os parabéns. Fora isso, era uma criança amorosa até, embora não conseguisse conversar quase nada comigo.

Impossível não notar o quanto era organizado. O oposto de mim! Saia fechando tudo que era porta aberta: de armário, de guarda roupa, de cômoda.

Com dois anos e meio mudamos de casa e de estado. Na nova cidade matriculei-o numa outra escola. Seu rendimento era bom. Embora eu percebesse que ele não tinha muita habilidade para pintar, contornar, desenhar. Fazia tudo isso com um desinteresse enorme.

Mas antes de ir pra escola já tinha aprendido sozinho, por meio do tablet, o que era triângulo, retângulo, quadrado, em português e inglês.

Durante um ano inteiro só fez um amigo na escola e se recusou a participar de todas as apresentações da turma naquelas tradicionais festas de páscoa, dia do índio e encerramento de ano letivo. Resolvi insistir pra que ele se juntasse aos amigos e à professora e subisse ao palco em uma destas comemorações. Ele deu um show. De choro e grito.

Por falar em birra, Davi não suportava frustração. Qualquer frustração. Por mínima que fosse. - Água gelada? Ele pedia. - Já te dou, deixa só eu terminar de dobrar esse lençol aqui. Isso era suficiente pra que ele se jogasse ao chão em gritos estridentes que, penso, os vizinhos iriam achar que ele estava sendo espancado.

Que gênio forte! Eu concluía desolada que o moleque iria me dar trabalho. E conversava com meu marido como iríamos contornar e resolver aquilo.


No ano seguinte, 2016, na festa de páscoa da escola tentei convencê-lo a se juntar à turminha dele. Tentativa que fui obrigada a abortar. Ele reagiu mal e chorou bastante. Quando a festa terminou procurei a professora. Perguntei: - Sinceramente, você acha que há algo errado com o Davi? Ela deu um suspiro profundo e aliviado. Me disse que fazia uns meses que vinha observando o comportamento dele e que a minha desconfiança tinha sido oportuna.

Fiquei sabendo que ele só sentava na mesma cadeira, que se ela estivesse torta não sentava e que enquanto a professora não dissesse pra ocupar o lugar dele, permanecia em pé no meio da sala. Também soube que tinha dificuldades de lidar com o fato dos coleguinhas mudarem de assento e com a quebra de rotina. A docente ainda me repassou outros detalhes e me disse: acho que seu filho tem Síndrome de Asperger, distúrbio que está incluído dentro do Transtorno do Espectro Autista (TEA).

Confesso que no primeiro momento quis transparecer neutralidade e calma. Mas recebi a notícia como se recebesse uma bomba. Chamei meu esposo, conversei com ele e fomos montar o quebra-cabeça da vida do Davi desde que ele nascera. Quantas evidências e a gente dormindo de touca! Depois do choque a primeira reação foi de culpa. Como não percebemos? Quanto tempo perdemos sem tratamento!

Mas, para me redimir, a memória me trouxe de volta as conversas com o médico: - Mãe, deixe de ser apressada, cada criança tem seu tempo.  E ele era um ótimo médico! E as professoras da escola anterior?  - Mãe, ele é tímido. Só isso.

Me perdoei.

Agora era tempo de correr atrás do prejuízo.  Oito meses depois da conversa com a professora, ainda não consegui laudo público, apenas particular. E o laudo da rede pública de saúde é fundamental para se obter os benefícios legais a que a criança com autismo tem direito. Mesmo aqueles que tem autismo leve, como é o caso do Davi.


Percebi, mais do que nunca, o quanto o sistema de saúde pública é falido e que eu tinha de ter um plano de saúde urgente. Agora ele já faz terapia ocupacional, fonoaudiologia e tem sessões com a psicóloga e consulta com a neuropsiquiatra.

Ainda precisa fazer um exame de cariótipo, com pesquisa de X frágil, para investigar geneticamente as causas do autismo e outras doenças associadas. Mas embora tenha plano de saúde, tenho que pagar pelo exame para ser reembolsada depois.

Davi teve progressos. Já se comunica melhor, está mais aberto ao diálogo, já interage com outras crianças, embora quase não sorri enquanto brinca com elas, e vai aceitando aos poucos a introdução de outros alimentos na dieta, que não sejam biscoitos de água e sal, achocolatado e vitamina de banana.

Há pouco tempo passou a mastigar os alimentos. Antes só os engolia. Mas ainda tem nojo quando alguém come perto dele. Já se permite sujar as mãos com tinta guache, mas tem pavor de uma gota de xixi que pingue no corpo quando vai ao banheiro.

Venho aprendendo, dia após dia, a lidar com ele. Já contorno a maioria de suas “birras” e esses dias tive o prazer de ser surpreendida por uma reação “tomou levou” dele. Ao se recusar a ficar com os primos na piscina da casa do meu irmão, ouviu de uma prima adulta: - Mas, Davi, você não quer tomar banho de piscina com seus amiguinhos? Vai perder mesmo, é? Ele retrucou na lata: - Na minha casa tem banheiros. Assim, no plural.

Outra pessoa talvez pensasse que ele foi mal educado e até grosseiro. Eu comemorei. Isso pra mim se chama progresso. Meu filho hoje tem quatro anos e só quem tem um filho autista em casa, sabe o que é conviver com um anjo na terra. Davi é um serzinho iluminado que sabe o nome de todos os planetas e que o sol é uma estrela. Dialoga com o irmão de 19 anos em inglês, idioma preferido dos dois, e me diz todos os dias, repetidamente, que eu sou muito legal. É um privilégio ser mãe dele. 


Josi Gonçalves é jornalista, casada com Francisco Costa, também jornalista (e dos bons), mãe do Ângelo, um nerd chato pra burro, e do pequeno Davi - que veio ao mundo para a mãe exercitar a arte da paciência. Josi também é filha, da Pauta. 

terça-feira, 29 de novembro de 2016

OS PACIENTES DO CONSULTÓRIO 05 E O SILÊNCIO INQUIETANTE

 



Umas 15 pessoas aguardavam o médico chegar em frente ao consultório 05. Eu, que aguardava o oftalmologista, estava sentada nas cadeiras reservadas ao dito consultório porque não havia nenhum assento vago em frente à sala onde eu seria atendida.

Não pude deixar de notar o silêncio inquietante que tomava conta do ambiente. Também pudera! Todos ali tinham um problema qualquer numa região que não tem boa fama. Quando se quer xingar alguém, o nome do local é invariavelmente invocado. Eles esperavam o proctologista.

De repente alguém rompe o silêncio. Uma mulher que estava bem atrás de mim, que vou batizar de Mariana e que aparentava uns vinte cinco anos, puxou assunto com a sua vizinha, que chamarei de Heloísa.

- Oi. É sua primeira vez aqui?

Heloísa, que devia ter uns 40 anos, lia uma revista Avon. Ela emitiu um sorrisinho tímido e confirmou que era a primeira vez que procurava ajuda para o seu problema. Mas não quis detalhar muito o que sentia.

Mariana resolveu quebrar o gelo. Falou que tinha uma fissura anal e ficou vendo a reação da outra. Oi? Agucei meu ouvido pra ouvir melhor aquela história. Tava mais interessante que ler a Tribuna do Norte, que só reproduzia o que todos os sites e emissoras de TV já haviam divulgado no dia anterior.

Heloísa confessou, bem baixinho, que achava que era isso que tinha também. Mariana prosseguiu dizendo que já tinha ido a outro profissional. No caso, uma médica. Disse o quanto foi difícil mostrar, digamos, seu “tesourinho” para a proctologista.

- É muito mais fácil abrir as pernas para ginecologista! Agora deitar de ladinho, segurar as nádegas e ainda abri-las para alguém ver o que você tem de mais sigiloso, íntimo, onde nem o sol bate, é demais!!

Helô, coitada, enrubesceu. Ficou mais vermelha que tomate! Pra falar a verdade, acho que eu também. E Mariana não colaborou pra diminuir o constrangimento da outra. Quer dizer, de nós duas:

- Você veio de calça? Eu já facilitei as coisas. Vim de saia mesmo. Aí nem preciso tirar nada. É só erguer o vestido, baixar a calcinha até o joelho e deitar de ladinho. Acho até que já perdi a vergonha. Já é a terceira vez que mostro!

- Ai, Senhor!! Será que ele vai querer ver assim? De primeira?

Não deu tempo da Mariana responder. Uma grávida que estava sentada ao lado direito dela, e que achei que tinha cada de Leonora, se meteu no papo que não estava tão discreto assim.

- E como é que você acha que ele vai saber o que você tem? Se prepare. Ele vai querer ver, sim.

- Mas eu tô menstruada!, rebateu Helô.

- O sangue pode correr no meio das pernas. Mas ele vai querer ver mesmo assim. Uma coisa é uma coisa. Outra coisa é outra coisa.

Coitada da Heloísa!! Eu estava vendo que em instantes aquela criatura fugir dali. Ela estava apavorada! A tal da Mariana quis consertar as coisas. Disse que todo o constrangimento valeria a pena. Que não tinha preço fazer o número dois sem sangrar e sem dor. Leonora também tentou amenizar as coisas.

- Mulher, esse médico é uma benção!! Além de ser muito bom, ele é bem humorado. Olhe, ele é tão brincalhão, que me disse que após fazer uma cirurgia numa paciente, tirou até uma foto do antes e depois pra mostrar pra cirurgiada como o dito cujo ficou lindo após o trabalho!

Putz! Era preferível que Leonora tivesse ficado calada. Se Heloísa não se sentia bem com a ideia do doutor ver seus segredos mais bem guardados, imagine só lidar com novidade que seu tesourinho poderia ser fotografado!!

Percebi que Mari ia falar mais alguma coisa, mas seu nome foi chamado pelo paciente que acabara de passar pela consulta. Foi inevitável não pensar o que iria acontecer naquela sala. Imaginei a cena, imaginei o médico pondo o dedo onde não era chamado, imaginei ele fotografando a zona sul e desejei nunca precisar ir ao consultório 05.

Quando Mariana saiu do consultório chamou o próximo paciente que, coincidentemente, era Heloísa. Em vez de ir embora ela esperou Helô na porta e sussurrou algo no ouvido da nova amiga. Fiz leitura labial e ri:

- Pelo menos o dedo dele é fininho, amiga.


Mariana não olhou pra trás, mas se tivesse feito teria visto uma Heloísa com cara de quem iria ser abatida num matadouro.

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Crônicas de Uma Gordinha Gostosa

Por Janete Kozak

Tem coisas que só as de pernas grossas entendem...
Tentava cumprir mais uma etapa do projeto “gordinha gostosa”. Consiste em pelo menos uma hora por dia de exercícios físicos durante a semana. Era dia de caminhada. Na verdade noite. E ela, a noite, estava mais que perfeita para a prática: a brisa refrescante animadora. A galera do vôlei ainda ali por perto socava a bola pelo ar - ufa, estava segura. Poucas pessoas caminhando por ali – nada de esbarrar em alguém hoje.
Lá fui eu, confiante.
Camiseta regata, top apertado pra firmar os seios, tênis confortável nos pés e a legging, a maravilhosa, poderosona e coringa legging. A amiga de todas as horas das gordinhas. Como cabe a uma gordinha assumida, tenho uma de cada cor. Preta, azul marinho, com estampas, sem estampas, um pouco abaixo dos joelhos, na altura das canelas, daquelas de encaixar nos calcanhares, das que simulam couro, e por aí vai.
Lá pela décima segunda volta – costumam ser catorze, suficiente pra preencher uma hora de treino – eis que surge ali, bem ali no meio do centro do interior do fundilho, um crec crec incômodo.
- Aí tem - pensei logo. E tinha. Em plena etapa final, com o corpo ensopadinho de suor, eis que que descubro entre as pernas uma fissura. A leaging não resistiu tamanha gostosura:
Pocou!!
Pocadinha da Silva Sauro...
Bem ali. Na junção das quatro partes que compõe uma legging básica. Ah infeliz! Tu não era companheira?
E agora, como fazer pra ir pra casa? São vários quarteirões abaixo. Penso num táxi, num moto-táxi, numa lotação, num coletivo, na possibilidade de uma alma boa passar por ali e ofertar uma carona. Mas nada, nadica de nada me aparece naquele momento.
O jeito foi mesmo ir pra casa a pé.
Tortura maior não há. Sem “aquela” parte protetora da calça?
As pernas roçam uma na outra, irritando, se batendo. Tento andar de pernas abertas, ir pra casa plantando bananeira, pular de uma perna só, tirar a blusa e colocar entrepernas...
Enfim chego em casa. Banho rápido, artilharia montada: pomada, talco, espelho, luz forte. Lá vem ela, a pequena, vendo “seus” apetrechos em minha mão, lasca logo uma pergunta:- mamãe, sua perereca tá ardida?
- Há se fosse só a perereca! Tudo está tão assado que daria um belo churrasco.
Atiro-me logo na cama. Besuntada de pomada contra assadura. E talco. E esperança de dias melhores...já pensou se o namorado aparece? Como explicar a ele, magrelo que só, que voltei de uma saidinha noturna com os fundilhos assados? Dá não. É divórcio antecipado, antes mesmo do casório.

Antes de dormir ainda arrisco uma oração: - Senhor, permita-me que o amanhã seja melhor que hoje. Amém.

domingo, 18 de setembro de 2016

Contrários

*Por Ivanete Damasceno 

O mundo é cheio de antíteses. E percebemos isso no cotidiano. Defender o que se acredita é muitas vezes motivo para punição. Acreditar que todos somos seres humanos, e se estamos no mesmo ambiente devemos gozar dos mesmos direitos e deveres ainda é sonho.

A liberdade de expressão e pensamento muitas vezes é cerceada pela censura oculta em sorrisos, elogios, abraços e pedidos carinhosos. Palavras doces somente na hora de impor.

O mundo é cheio de antíteses. E percebemos isso no cotidiano das nossas próprias contradições. Dos nossos desejos e acusações. Para cada sorriso uma lágrima se esconde. Para cada elogio, uma acusação fica oculta. Para cada abraço uma traição é disfarçada.  Para cada pedido carinhoso uma ordem é dada.

Nada é percebido ou nos acostumamos com esse caos?
Esse é o cotidiano cheio de contradições!